sexta-feira, 12 de março de 2010

Afeto e autoridade na educação das crianças Gérard Guillot

Ano VI - Nº 17 - Pedagogia das relações - Julho à Outubro 2008

"Educar uma criança supõe conduzi-la ao racional e ao razoável sem negligenciar sua experiência afetiva"

Uma criança tem necessidade de um quadro estruturante, com referências e limites claros, para construir sua personalidade. Dessa perspectiva, todos os adultos encarregados de sua educação têm o dever de assumir suas respectivas responsabilidades, evitando o duplo perigo, de um lado, do autoritarismo e, de outro, do permissivismo. Um professor, um pai ou mãe ou um educador deve instaurar as "regras do jogo social", do viver junto, sem impor uma tirania subjetiva nem uma não-diretividade mal compreendida.

O "capricho do príncipe" transforma o sujeito em objeto. O "professor camarada" parentaliza a criança, jogando nas costas dela cargas que vão muito além de sua maturidade. Em suma, educar as crianças requer que os adultos ousem assumir sua autoridade de "adultos do cotidiano", que está muito longe das sereias dos falsos adultos do mundo do espetáculo e do universo midiático onde costuma reinar um adolescentrismo ou mesmo uma infantilização. Para isso, o adulto deve adotar aquilo que chamei de autoridade de bons-tratos (Guillot, 2008).

Esta tem como principal função autorizar a ser, a existir, a crescer, a expressar emoções (alegria, raiva, tristeza), a aprender, a amar, a criar. Implica o respeito, a priori e incondicional, à pessoa da criança. Trata-se de uma postura ética, cuja exigência suprema é promover a condição humana em toda criança, quaisquer que sejam suas particularidades. Porém, autorizar a ser não autoriza a fazer o que quiser: proibições, limites e regras são indispensáveis, com a condição de incidirem sobre o que as crianças fazem, jamais sobre o que elas são.

As proibições fundamentais dizem respeito a qualquer conduta que atente contra a dignidade humana delas mesmas ou de outrem. Assim, entre as regras do viver junto, é preciso distinguir as regras éticas e legais, não-negociáveis, e as regras normativas ou convencionais que se constroem, por exemplo, com os alunos na sala de aula. As primeiras são fundadoras do vínculo humano; as segundas, condicionadas às primeiras, permitem associar os alunos à sua elaboração a fim de responsabilizá-los com os vínculos sociais que se tecem nas diversas situações da vida.

Mas uma criança não é um ser de pura razão (como, aliás, tampouco o adulto). Cada criança, em sua singularidade, comporta-se em função de sua afetividade, de sua experiência emocional. Além disso, uma criança vive no presente. Sua educação tem uma dupla finalidade: primeiro, levá-la a conciliar seu princípio de prazer com o princípio de realidade, para usar os termos freudianos; segundo, favorecer sua inscrição na temporalidade longa, que é a da história, como também a de toda aprendizagem. A primeira finalidade esbarra no obstáculo do capricho, da chantagem afetiva; a segunda esbarra na dificuldade de "adiar o prazer" (Freud, 2004).

Os afetos, as emoções e os sentimentos são essenciais. Não se trata absolutamente de negá-los, de reduzi-los nem de atrofiá-los: trata-se conciliá-los com a objetividade, a lucidez e o espírito crítico que a escola tem como missão desenvolver. Um ser puramente cognitivo, se pudesse existir, seria frio, aborrecido, perigoso e, sem dúvida, infeliz. Seria mutilado dessa parte de humanidade que é também de coração, de desejo e de carne. O ser humano, desde a mais tenra infância, é um ser plural: nele o intelecto e a razão misturam-se com o sonho e o imaginário.

Educar uma criança supõe, portanto, conduzi-la ao racional e ao razoável sem negligenciar sua experiência afetiva. Isso não significa, porém, que devamos amar toda criança: o amor é eletivo, a simpatia é fonte de exclusão. Nem todas as crianças - e o mesmo se aplica aos adultos - parecem-nos simpáticas e, reciprocamente, nem sempre somos simpáticos a elas. Seria um erro querer fazer o jogo da simpatia, da sedução pedagógica, pois assim se desviaria o objetivo cultivando o próprio narcisismo. Um educador, um professor em particular, é um profissional da educação, não um tecnocrata sem estados de alma, mas um homem ou uma mulher que, com a distância do respeito, sabe demonstrar cordialidade calorosa, sem projeção subjetiva, e empatia em relação a todas as crianças. A questão é amar o estado de infância da humanidade em cada um.

Uma grande dificuldade é não se deixar levar pelas fortes demandas espontaneamente afetivas das crianças. A pedagogia é a arte de não responder afetivamente a essas demandas, mas de oferecer como resposta uma benevolência compreensiva que as reoriente para um outro terreno. É por isso que o relacional necessita de mediações para não cair no confusionismo. Assim, um professor é um mediador entre a criança e os valores éticos universais, entre a criança e a lei, entre a criança e as aprendizagens, entre a criança e a ação.

Se a escuta e o diálogo são evidentemente essenciais, a ação também o é. Uma criança é um ser de emoção e de ação. Ao chegar à sala de aula, sua primeira expectativa, ao menos no início, é "O que é que a gente vai fazer?". É muito comum que o adulto adie a ação em proveito de uma introdução com longas explicações e, diante desse discurso, muitos alunos perdem a vontade de fazer, isto é, a motivação. Aprende-se fazendo, e as reflexões sobre a ação, as sínteses durante o trajeto e depois uma síntese final permitem às crianças compreender melhor, obviamente, do que um "modo de usar" anunciado previamente e a ser executado. É comum que os alunos aprendam respostas a perguntas que não se fizeram.

Começar uma aula é se colocar em posição de questionamento, de um questionamento do qual o aluno pode apropriar-se sem se resignar a "seguir" instruções. O "sentido" é a direção: se não for percebido no início, os "familiarizados" com o sistema escolar usarão do oportunismo escolar adquirido (particularmente em função de seu meio social e cultural de origem), enquanto os outros procurarão empiricamente, tateando às cegas − e, como sabemos, o fosso entre os dois grupos se aprofundará. A pedagogia deve ser uma aventura comum que apague as heranças, uma história a construir juntos, graças a projetos, e não um destino a se submeter.

A educação das crianças consiste em organizar atividades nas quais elas aprendam juntas a cooperar. Dessa perspectiva, os adultos têm um dever de exemplaridade: trabalhar em equipe é apresentado hoje como uma evidência, mas muitas vezes o obstáculo é o afetivo: "Eu quero muito trabalhar, mas não com ele ou com ela!". Além disso, os professores, os pais, os educadores, os atores institucionais e sociais que participam dessa educação também devem cooperar, colocando em prática uma parceria que respeite sempre o ponto de vista do outro, a mais cordial possível, uma parceria que não deve ser facilmente reduzida a uma parceria de afinidades, mas sim uma parceria de competências.

Para concluir, a noção que está ao mesmo tempo na base e no horizonte de relações frutíferas entre crianças, entre crianças e adultos, entre adultos, é a da auto-estima. Uma auto-estima negativa - isto é, não se amar, não se estimar, desvalorizar-se - conduz às duas atitudes de defesa de que dispomos: a inibição, o retraimento ou a agressividade, e a arrogância compensatória de um complexo de superioridade geralmente fonte de uma sede de poder. Para se estimar, é fundamental não só se sentir respeitado e estimado pelos outros - é o registro do olhar e da palavra -, mas também aprender a se estimar mais - é o registro da ação e da ação compartilhada. Desenvolver o sentimento de auto-eficácia, como mostram, por exemplo, os trabalhos de Bandura (1997) em psicologia cognitiva, é uma chave educativa e pedagógica essencial.

Na escola, e ao longo de toda a vida, não se aprende por aprender, mas se aprende para, de forma progressiva e sem fim, pensar e julgar por si mesmo. A autonomia e o espírito crítico e criativo formam-se e desenvolvem-se graças às aprendizagens. Contudo, também se aprende para experimentar o prazer de descobrir e compreender o mundo, de operar com os outros. Uma criança pequena não aprende de maneira seca e direta: ela aprende investindo sua corporeidade, sua sensibilidade e seu imaginário. É preciso primeiro sonhar o mundo para depois compreendê-lo: daí a importância, particularmente, da educação artística e da expressão corporal.

Não se trata de relegar a um futuro hipotético o domínio da língua e da matemática, mas sim de nutri-la de competências transversais: uma regra árida e necessária não pode ser incorporada sem ser irrigada pela seiva de imagens, de metáforas, de exemplos familiares, que são o trampolim da abstração. Ao professor cabe encontrar os "balões dirigíveis pedagógicos" que ajudem o aluno a se elevar acima do labirinto cambiante de suas representações: aparecerão caminhos errantes para levar ao essencial. Acompanhar com júbilo e vigilância, como Sócrates, pastor de uma verdade estelar, não seria o papel "ideal" de um professor? Aprender e ajudar a aprender é entrar em desejância.

REFERÊNCIAS

BANDURA, A. Self-efficacy: the exercise of control. New York: W.H. Freeman and Co Ltd, 1997. GUILLOT, G. O resgate da autoridade em educação. Porto Alegre: Artmed, 2008. FREUD, S. Introduction à la psychanalyse (1916). Paris: Payot, 2004

Fonte:http://www.revistapatio.com.br

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